NO REINO DAS EMOÇÕES
Por Adriano Saciloto
Terapeuta
Desde Darwin [1], as ciências da biologia, psicologia e psiquiatria têm se interessado em fazer uma espécie de “ponte” entre a evolução biológica e seus reflexos nas estruturas mentais, cerebrais e psicológicas do ser humano.
Descobriu-se que todos os organismos vivos, desde as estruturas mais simples, unicelulares, até as mais complexas como o ser humano, possuem um grau de consciência, de ação refletida, um funcionamento automático, que são as emoções. Este grau de automatismo, desenvolvido ao longo dos processos evolutivos, foi importante aliado na sobrevivência e perpetuação das diferentes espécies. Com essa finalidade, foram se desenvolvendo estruturas orgânicas inteligentes – cérebros – de modo a gerar respostas rápidas e automáticas aos estímulos do ambiente externo. Tais respostas automáticas são coordenadas por uma área do cérebro chamada cérebro primitivo, reptiliano, tronco cerebral, também conhecido como sistema límbico. Essa é a área do cérebro responsável por processar os conteúdos da subconsciência armazenados durante o transcorrer do tempo e transformá-los em comandos que geram ações automáticas como fechar os olhos, dormir na hora certa, fazer sexo, regular os ritmos cardíacos e respiratórios, afastar-se do perigo, entre outras.
Com o avanço da neurociência, descobriu-se, também, que é o sistema límbico que gerencia as emoções, o qual, a partir daí, passou a ser chamado também de sistema das emoções.
Segundo Joseph Gleber [2], quando o homem começou a elaborar um raciocínio coerente, adquirindo a razão, o subconsciente passou a agir como depositário das experiências passadas adquiridas durante os milênios de evolução, cedendo lugar à atuação do intelecto. Entretanto, a grande maioria da humanidade, continua agindo em sintonia com os automatismos da subconsciência, permanece nas paixões, nas emoções e nos desejos. Ou seja, os seres humanos ainda funcionam no nível básico das emoções. Diante de qualquer circunstância, a nossa primeira resposta é emocional.
E é por esta razão que é de extrema importância conhecermos e entendermos com maior profundidade as emoções.
Mas, afinal, o que são emoções?
Uma emoção é uma resposta, inconsciente e automática do nosso cérebro primitivo a um estímulo externo. Segundo Robert Plutchik [3], cada emoção é o gatilho de um comportamento com alto valor de sobrevivência.
A manifestação de uma emoção desencadeia uma série de processos fisiológicos (reações químicas, fisiológicas, liberação de hormônios, etc.), a fim de gerar um comportamento de luta ou fuga, sem que se quer tomemos consciência disto, dada a rapidez com que esse processo acontece.
Em sua Teoria Psicoevolucionária Integrativa das Emoções, Plutchik elaborou 10 postulados, dentre os quais se destacam os seguintes:
- o conceito de emoção é aplicado a todos os níveis evolutivos e se aplica a todos os animais, incluindo os humanos;
- as emoções desempenham um papel adaptativo ao ajudar os organismos a lidarem com as principais questões de sobrevivência colocadas pelo ambiente;
- apesar das diferentes formas de expressão das emoções, em diferentes espécies, existem certos elementos comuns entre elas, padrões protótipos, que podem ser identificados;
- estes padrões protótipos são chamados de emoções básicas ou primárias;
- todas as demais emoções são estados mistos ou derivados. Isto é, eles ocorrem como combinações, misturas ou compostos das emoções primárias.
Foi com base nestes postulados que Plutchik elaborou a chamada Roda das Emoções, um recurso gráfico, em forma de flor, com oito pétalas de diferentes cores, que mostra e identifica as diferentes emoções e as relações que se estabelecem entre elas (Fig. 1).
Partindo da analogia com o círculo cromático, Plutchik afirma que todas as emoções podem variar em grau de intensidade e combinar-se entre si, dando origem a outras emoções – secundárias -, assim como acontece com as cores, que de suas misturas surgem novas cores e tons. Por exemplo, a emoção medo, que pode variar de uma simples apreensão a um estado de terror ou pânico; a emoção raiva que pode se manifestar desde um leve aborrecimento até uma raiva intensa ou ira.
Alguns exemplos de emoções compostas, derivadas da combinação de emoções primárias:
- Medo + Surpresa = Intimidação
- Raiva + Antecipação = Agressividade
- Antecipação + Alegria = Otimismo
- Medo + Tristeza = Desespero
- Surpresa + Nojo = Descrença
- Surpresa + Alegria = Satisfação
- Medo + Antecipação = Ansiedade
São muitas as possibilidades de combinações das emoções, visto que, segundo Haroldo Dutra Dias [4], alguns pesquisadores dizem que o ser humano é capaz de expressar em torno de 42mil emoções.
No quadro abaixo é apresentada uma breve descrição das emoções básicas de Plutchik [5], mostrando as circunstâncias em que são ativadas e qual o seu propósito.
EMOÇÃO | DESCRIÇÃO |
ALEGRIA | emoção expansiva que resulta em um aumento de energia, é ativada com acontecimentos positivos. Sua função é reproduzir aquelas ações que a geram e a abertura para as pessoas |
CONFIANÇA | emoção relacionada com a segurança e esperança nos aspectos positivos. Sua função é a incorporação e permite gerar laços sociais e apoio |
MEDO | é uma emoção de sobrevivência que previne do perigo, permite agir com cautela e é ativada pela percepção de um estímulo ameaçador. Sua função é a orientação para a proteção |
SURPRESA | emoção que é ativada diante do inesperado ou imprevisto. A função dessa emoção é a orientação, pois facilita os processos ligados à atenção e à exploração |
TRISTEZA | emoção introspectiva que permite a reorganização da pessoa e enfrentamento das perdas, uma vez que é ativada diante delas. Sua função é a reintegração, o reconhecimento da perda e o conhecimento dos próprios limites |
NOJO | emoção de sobrevivência que previne do perigo, é ativada diante da percepção de objetos, substâncias ou, inclusive, entidades que nos ameaçam. Sua função é a de proteção através da geração de rejeição |
RAIVA | emoção que se conecta com a força, é ativada diante da frustração, decepção ou quando a energia de nosso desejo e objetivo é bloqueada por um obstáculo. A função da raiva é a mobilização de energia orientada para provocar uma mudança em uma situação que é irritante, bem como a destruição do perigo |
ANTECIPAÇÃO | é a emoção ligada à busca de recursos ou alternativas de forma prévia mediante a geração de expectativas. Permite a preparação e sua função é a de exploração |
Qual a importância das emoções em nossa vida?
A compreensão do funcionamento das emoções nos dá condições para exercermos efetivamente o autodomínio, autoconhecimento, e desenvolvermos a verdadeira inteligência emocional, permitindo com que nos tornemos, talvez, seres humanos no mais profundo sentido da palavra.
Mas afinal, como podemos adquirir inteligência emocional, sem conhecer a fundo as emoções? Conhecer o seu funcionamento nos permite aproveitar todo o seu potencial a nosso favor, visto que os diversos tipos de enfermidades que experimentamos, sejam elas físicas ou psicológicas, guardam relação estreita com conflitos emocionais vivenciados. Gerenciar, administrar e, principalmente, acolher uma emoção terá reflexos diretos em nossa saúde física e mental. No momento em que tentamos reprimir a manifestação de uma emoção, o que acontece na verdade é apenas um redirecionamento do fluxo de energia para um órgão ou tecido específico do corpo, dando origem a algum tipo de disfunção ou enfermidade.
Considerando que a manifestação de uma emoção é um processo extremamente rápido e ainda fora do nosso controle, uma boa prática para nos mantermos equilibrados, seria adotarmos uma postura de menor reatividade. Isto é, toda vez que nos sentirmos “ofendidos”, “agredidos”, postos em “perigo” por alguém ou alguma situação, o que temos a fazer é parar, pensar e refletir sobre o porquê estamos nos sentindo ofendidos. Agindo desta forma, daremos o tempo necessário para que este “bloco” de energia/informação migre da mente subconsciente para a consciente, a fim de que tomemos a atitude mais acertada e pacífica, mantendo a harmonia em nossa vida e no ambiente em que vivemos.
Portanto, nenhuma emoção pode ser considerada ruim, pois cada uma tem a sua finalidade e desempenha um papel importante em nossa evolução. O medo, por exemplo, é responsável por nos afastar do perigo; a antecipação nos faz ir em busca de recursos para atender nossas expectativas, promovendo a exploração; a confiança nos propicia segurança e a geração dos laços sociais e de apoio e assim por diante.
E você, já parou para refletir sobre qual emoção está mais presente na sua vida? Identificá-la, observar em que circunstâncias ela se apresenta e investigar os verdadeiros motivos pelos quais ela se manifesta é um bom caminho para o autoconhecimento e melhoria da sua relação consigo mesmo, com as pessoas do seu convívio e com o mundo.
Referências
[1] Charles Darwin (1809-1882): Naturalista, geólogo e biólogo britânico, elaborou a teoria da evolução das espécies por meio da seleção natural. Em https://pt.wikipedia.org/wiki/Charles_Darwin
[2] Joseph Gleber, espírito. Cientista alemão, nascido em 1904. PINHEIRO, Robson. Pelo espírito Joseph Gleber; Medicina da Alma. 2ª ed.amp. – Contagem, MG: Casa dos Espíritos Editora, 2007
[3] Robert Plutchik (1927-2006), pesquisador e psicólogo estadunidense. Em https://en.wikipedia.org/wiki/Robert_Plutchik
[4] HAROLDO DUTRA DIAS, Juiz de direito do Tribunal de Justiça de Minas Gerais, escritor, tradutor, e conferencista brasileiro. Em https://pt.wikipedia.org/wiki/Haroldo_Dutra_Dias
[5] IRENE ALABAU, A roda das emoções de Robert Plutchik, em https://br.psicologia-online.com/a-roda-das-emocoes-de-robert-plutchik-237.html
Sugestões de estudos e conteúdos para aprofundamento do tema
Livros e artigos:
PINHEIRO, Robson. Além da Matéria. 10ª ed. rev. – Contagem, MG: Casa dos Espíritos Editora, 2011
A BÚSSOLA E O LEME, de Haroldo Dutra Dias
The Science of ‘Inside out’, The New York Times, Paul Ekman, em https://www.nytimes.com/2015/07/05/opinion/sunday/the-science-of-inside-out.html?searchResultPosition=1, tradução para português em https://sukha.net.br/a-ciencia-por-tras-de-divertidamente-por-paul-ekman/
Vídeos:
HAROLDO DUTRA DIAS, O mundo das emoções, vídeo Canal Odisséia, em https://www.youtube.com/watch?v=g49_c05Pz3s
HAROLDO DUTRA DIAS, Os seis pares de emoções, vÍdeo Canal Odisséis, em https://www.youtube.com/watch?v=FcuZnAnmUxU
ADRIANO SACILOTO, Por que as pessoas ficam doentes? Como acontece o processo de adoecimento, PARTE 1, em https://www.instagram.com/p/Cb8a_ATIUM4/
ADRIANO SACILOTO, Por que as pessoas ficam doentes? Como acontece o processo de adoecimento, PARTE 2, em https://www.instagram.com/p/Cb8cIF0o5Vt/
ADRIANO SACILOTO, Por que as pessoas ficam doentes? Como acontece o processo de adoecimento, PARTE 3, em https://www.instagram.com/p/Cb88m4dKsSW/
CANAL ODISSÉIA, de Haroldo Dutra Dias, em https://www.youtube.com/c/HaroldoDutraDiasOdisseia
Equilíbrio emocional e convivência, H.D.Dias, em https://www.youtube.com/watch?v=749qx0nhmGw
Padrão de reconhecimento das emoções, H.D.Dias, em https://www.youtube.com/watch?v=hiImNiYTJZo
Se permita viver com as emoções para lidar bem com a ansiedade, H.D.Dias, em https://www.youtube.com/watch?v=Bc_EwhJXZ_c
Como lidar com o medo nos dias atuais, H.D.Dias, em https://www.youtube.com/watch?v=yShzkC_wF9E&t=880s
Esquema mental x reações emocionais, H.D.Dias, em https://www.youtube.com/watch?v=SnOzlPdtRmc
Roda das emoções – Gestão de Sucesso, Prof. Jakson José Gomes de Oliveira, em https://www.youtube.com/watch?v=-EuBVtsT2N4&t=420s
Filme:
DIVERTIDAMENTE, animação Disney Pixar.
Revisão: Gisele Scafuro
Edição: Karen Suckow e Rogerio M. Ovsiany
Foto: Andrea Piacquadio: https://www.pexels.com/pt-br/foto/foto-de- colagem-de-mulher-3812743/